30.3.11

A REPÚBLICA NA LOURINHÃ - A implantação do regime republicano na Lourinhã: realizações e dificuldades.


TRABALHO DOS ALUNOS DO 9.º ANO da EB de Ribamar - 2009/2010


Da pesquisa efectuada resultou:

- a publicação de páginas Web, com o seguinte endereço:




- um DVD, apresentado à comunidade nos dias 24 de Junho - feriado municipal - e 4 de Outubro, no auditório da AMAL, na Lourinhã.

2.3.11

A pintura e a escultura da Igreja de Santa Maria do Castelo da Lourinhã no Antigo Regime
(do século XVI ao início do século XIX)

A igreja matriz da Lourinhã, de invocação a Nossa Senhora da Anunciação, mais conhecida por Santa Maria do Castelo por ter sido erguida dentro das muralhas do desaparecido castelo, foi construída na segunda metade do século XIV, em estilo gótico. Foi sagrada pelo ilustre arcebispo de Braga - D. Lourenço Vicente -, natural da Lourinhã e seu senhor entre 1384-1397.
Quando se entra nesta igreja, classificada monumento nacional em 1922, não podemos deixar de nos impressionar pela beleza deste espaço. A elegância das suas colunas e dos arcos em ogiva, o naturalismo dos seus capitéis, a notável abóbada de cruzamento de ogivas que cobre a capela-mor, iluminada por cinco alongadas janelas geminadas e, na parte oposta do templo, o rendilhado da sua rosácea, fazem deste edifício uma referência na região.
Fig. 1 - Capítulos das Visitações à Igreja de N. S.ª da Anunciação, Lourinhã, 1679-1822

Idêntica sensação terá tido o representante do arcebispo ao contemplar este templo, quando o visitou entre 26 e 28 de Junho de 1683. Nos capítulos da visitação referiu que esta igreja era das “mais authorizadas” do arcebispado, não apenas pela sua antiguidade e grandeza, como também pelos ministros que a serviam (tinha então 10 sacerdotes ao seu serviço) e pela “nobreza desta villa”. Mas a igreja que o visitador observou e aquela que os habitantes da freguesia da Lourinhã semanalmente frequentavam para a missa dominical não tinha o aspecto actual. De facto, não se pode deixar de estranhar o despojamento actual deste templo – tem apenas um altar - o altar-mor -, o que é decerto invulgar num espaço de culto.
Na pesquisa efectuada sobre as Visitas Pastorais à Lourinhã no século XVII, no âmbito da dissertação de mestrado em História Regional e Local, encontrei, na Torre do Tombo, um Inventario dos Moveis da Freg.ª Matriz e Collegiada de N. Snr.ª da Anunciação ou Annunciada da vila da Lourinhãa, datado de 15 de Novembro de 1806, que contém um rol dos altares, obras de arte, paramentaria e objectos litúrgicos. Pela descrição que faz do interior da igreja, não será difícil imaginar a magnificência dos seus altares, provavelmente em talha dourada como era comum na maioria dos nossas igrejas, cobertos com os respectivos frontais, ou a centralidade do seu púlpito, antigo e de grades, decorado com panos de seda ou damasco, para onde os fiéis dirigiam a sua atenção na homilia dominical e nas grandes pregações feitas durante as festas maiores do calendário litúrgico. Ou ainda, a partir de outras fontes, visualizar o esplendor da liturgia das horas canónicas, que quotidianamente eram cantadas pelos oito beneficiados da Colegiada e cujo coro funcionava na capela-mor, separada, nessa época, do corpo da igreja por um gradeamento.
As várias imagens, que estavam nas paredes, nos altares ou na sacristia, dão-nos informações muito interessantes sobre o universo devocional do povo da Lourinhã no Antigo Regime, bem como das devoções incentivadas pela Igreja após o Concílio de Trento (1545-1563).
No altar-mor estava colocada uma “perfeita” imagem de N. S.ª da Anunciação no trono e um Crucifixo sobre a banqueta do altar; nas paredes da capela-mor, do lado do Evangelho, um painel da Anunciação e outro da Adoração dos Magos e do lado da Epístola, um painel do Nascimento de Jesus Cristo e outro da Assunção de Nossa Senhora, todos muito antigos.
No corpo da igreja, do lado do Evangelho, havia dois altares colaterais: no primeiro estavam as imagens de S. Miguel, Santo António e Santa Luzia, todas de madeira; o segundo era uma capela interior onde se encontrava o Sacrário do Santíssimo Sacramento. Do lado da Epístola, no primeiro altar colateral estavam imagens antigas de S. João Baptista e de Santo Antão, todas de madeira e uma de S. Marcos, de pedra retocada; no segundo, uma “perfeita” imagem de Cristo Crucificado e duas de Nossa Senhora, do Rosário e da Saúde, todas de madeira. Sobre o átrio do Cruzeiro havia uma “grande e perfeita” imagem de Cristo Crucificado.
Na sacristia existia uma imagem muito antiga da Senhora da Anunciada, de pedra, outra da Senhora do Patrocínio e ainda outra do Senhor Ressuscitado; três painéis muito antigos, um de S. Francisco de Assis, outro de Santa Luzia, outro de Santa Margarida, um Cristo Crucificado e duas imagens do Menino Jesus.
Apesar do referido inventário datar apenas de 1806 (finais do Antigo Regime), algumas das imagens remontam a um período mais antigo. Com efeito, os painéis da capela-mor (actualmente na igreja do convento de Santo António) foram identificados pelos historiadores de arte como sendo pinturas quinhentistas e as fontes consultadas permitem-nos datar outras obras de, pelo menos, do século XVII. Com efeito, o culto a Santa Luzia foi introduzido por Simão Fernandes que instituiu uma confraria com esse objectivo, quando era beneficiado da Colegiada, entre os anos de 1623 ou 1624, datas prováveis da sua chegada à Lourinhã e 1639, ano em que foi preso pela Inquisição acusado de ser cristão-novo. Será esta a bela imagem seiscentista, adquirida por este beneficiado e que Rui Cipriano diz ter sido transferida pela população do Seixal para a sua igreja? O processo de Simão Fernandes também refere que este sacerdote celebrava diariamente, ora no altar de S. João, ora no altar de Santo António e que tinha alcançado, de Roma, um Breve para ser privilegiado o altar de Nossa Senhora do Rosário (existia também na igreja paroquial uma confraria com esta invocação desde os finais do século XVI).

Fig. 2 – Ruínas da Igreja Matriz da Lourinhã, gravura dos finais do século XIX, [SIPA FOTO.0822935 © IHRU].

O abandono desta igreja, pouco depois da extinção das ordens religiosas em 1834, e a transferência da matriz para a igreja do convento de Santo António, com as respectivas imagens, fez com que se perdesse o rasto a algumas delas. Quando a Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais procedeu ao restauro da velha igreja matriz (1931-1935), a concepção dominante era a de que se deveria devolver o templo à sua “pureza” primitiva, neste caso à sua raiz medieval. Daí que tenham sido retirados muitos dos acrescentos posteriores, nomeadamente a sacristia, que já aparece referida na visitação de 1630.
Em 1991, 3 de Março, com a presença do Cardeal Patriarca de Lisboa, D. António Ribeiro, a igreja de Santa Maria do Castelo recuperou o estatuto de Matriz da Lourinhã, na sequência de diligências feitas pelo pároco de então - P.e Joaquim Batalha. Que este e outros trabalhos contribuam para recuperar a memória da dignidade deste espaço!

(artigo publicado no jornal Alvorada, em 4.02.2011)


Maria dos Anjos dos Santos Fernandes Luís,
professora de História da EB de Ribamar

FONTES:
— Arquivo Paroquial da Lourinhã/Convento de Santo António, Capítulos das Visitações à Igreja de Nossa Senhora da Anunciação, 1679-1822.
— IAN/TT, Arquivo Histórico do Ministério das Finanças, Mesa da Consciência e Ordens, Ordem de Cristo, Autos de Posse da Comenda de Nossa Senhora da Anunciação da Lourinhã, 1677-1829, cx. 62, Cap. 8, fl. 12.
— IAN/TT, Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Lisboa, Simão Fernandes, proc. n.º 6621, 09.05.1639-19.08.1649, fls. 40, 136 e 137.