A Pintura Quinhentista da Igreja Matriz da Lourinhã
Viviana Ferreira e Carolina Miguel, 8.º C
Como referimos em artigo anterior (Alvorada, 04.02.2011, p. 11) existia na capela-mor da Igreja de Santa Maria do Castelo quatro pinturas do século XVI - Anunciação, Adoração dos Pastores, Adoração dos Reis Magos e Assunção da Virgem. Estas obras, entre outras, foram transferidas para o convento de Santo António, pouco depois da extinção das ordens religiosas (1834) e da transferência da matriz da Lourinhã para a respectiva igreja. É provável que estas pinturas – óleo sobre tábuas de castanho - fossem do mesmo artista que pintou o retábulo da Igreja Matriz de Arruda dos Vinhos, pintor cujo nome se desconhece e que, por isso, recebeu o nome de conveniência de Mestre da Arruda. Segundo Joaquim Caetano «[…] o Mestre de Arruda dos Vinhos caracteriza-se pelo tratamento plástico dos panejamentos colados aos corpos ou em pregas curvas criando linhas sinuosas e sensuais que demarcam as sombras com suavidade, o mesmo gosto pela utilização de arquitectura renascentista, um alteamento das figuras de primeiro plano, já fortemente maneirista e um colorido de forte sentido decorativo, ainda que algo limitado na paleta.» Com efeito, estas obras, pintadas provavelmente entre 1530 e 1550, revelam já uma influência do Maneirismo. Esta corrente artística impôs-se na Europa, sobretudo em Itália, entre 1530 e 1580 e marcou a passagem do equilíbrio clássico e da serenidade do Renascimento para o complicado e sobrecarregado estilo Barroco. O nome deriva da imitação das «maneiras» cultivadas pelos grandes mestres italianos, como Miguel Ângelo, Rafael e Leonardo da Vinci. Começam a aparecer as figuras alongadas, retorcidas (o serpentinato), em posições afectadas e teatrais, sugerindo-se o movimento em composições por vezes desequilibradas. Passemos agora à análise das imagens, ou seja, dos episódios bíblicos e da mensagem que nos transmitem, bem como da simbologia que lhes está associada.
Anunciação
Este quadro representa Nossa Senhora e o Anjo Gabriel. Segundo o Evangelho de São Lucas, Deus enviou o anjo Gabriel anunciar a Maria que ela iria ser mãe de Jesus. Desde a Idade Média, que o tema da Anunciação tem sido muito representado na pintura. Para além das figuras centrais, podemos ainda encontrar os elementos típicos de um quadro sobre a Anunciação a Nossa Senhora como a pomba, o lírio e o livro. A pomba representa o Espírito Santo, símbolo da encarnação, em que Deus se torna homem na pessoa de Jesus; o lírio branco, símbolo de pureza, significa a virgindade de Maria e o livro remete para a profecia do Antigo Testamento de um nascimento virginal.
Adoração dos Pastores
Por um decreto do imperador romano, Octávio César Augusto, todas as pessoas que viviam no império tinham que se recensear. Como José era de Belém, pequena cidade no sul da Judeia, para aí se dirigiu com Maria, pouco antes de Jesus nascer. E foi num estábulo, onde encontraram abrigo, que Jesus nasceu. Os Evangelhos falam de pastores que, estando nas proximidades e ouvindo anjos a cantar Glória a Deus nas alturas e, na Terra, paz e boa vontade entre os homens, o foram adorar. Neste quadro podemos encontrar o menino Jesus na manjedoura, Nossa Senhora, São José e os três pastores. Os pastores encontram-se a adorar o menino. Os anjos, por cima, são um dos elementos típicos dos quadros que representam o Presépio. É de salientar ainda os jogos de luz e cor utilizados na recriação de um ambiente nocturno.
Adoração dos Reis Magos
Segundo o Evangelho de São Mateus, sábios do Oriente, designados magos, foram guiados por uma estrela até Belém, onde encontraram Jesus com sua mãe, a Virgem Maria. Os Magos adoraram o menino Jesus e ofereceram-lhe ouro, incenso e mirra. São representados com vestes e turbantes luxuosos, animais exóticos, como elefantes e relicários preciosos contendo as oferendas. A partir da Idade Média esses sábios foram denominados reis, para se distinguirem dos feiticeiros e foram-lhes atribuídos nomes: Gaspar, Melchior e Baltasar. Já nos finais desse período, começaram a ser retratados como pessoas de raças diferentes, de modo a simbolizar os três continentes conhecidos à época: Europa, Ásia e África.
Assunção da Virgem
De acordo com o Novo Testamento, Maria esteve presente em alguns momentos decisivos da vida adulta de Jesus, nomeadamente na crucificação, em que é quase sempre representada de joelhos ao pé da cruz. Depois, teria ido para Éfeso, na Turquia, acompanhada por S. João Evangelista, onde permaneceria até ao fim da vida. Três dias após a sua morte, o corpo e a alma de Maria foram elevados aos céus, no que seria denominado de Assunção da Virgem. Nas representações artísticas, a Virgem aparece sustentada por anjos. Em baixo, o seu túmulo está rodeado pelos apóstolos, que olham, admirados, para cima.
A unidade temática deste conjunto de painéis, em torno da figura de Nossa Senhora, justifica plenamente a encomenda de uma igreja matriz, cuja padroeira é Nossa Senhora da Anunciação.
Bibliografia:
LODWICK, Marcus, Guia do Apreciador de Pintura, Lisboa, Ed. Estampa, 2003. SERRÃO, Victor, História da Arte em Portugal – O Renascimento e o Maneirismo (1500-1620), Lisboa, Editorial Presença, 2002, pp. 226-229.
Artigo publicado no jornal Alvorada, 04.03.2011
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