20.12.11

Visita de Estudo à Igreja Santa Maria do Castelo da Lourinhã
Tiago Pereira



Foi no dia 9 de Novembro de 2011 que a turma A do 8º ano, da EB de Ribamar, visitou a Igreja Santa Maria do Castelo da Lourinhã, assim conhecida por ter sido erguida dentro dos muros do desaparecido castelo. Os alunos foram acompanhados pela professora de História, Maria dos Anjos Luís e pelo professor de EMRC, António César.
A visita começou com uma breve apresentação da história desta igreja, feita pela professora de História. É um edifício gótico, construído na segunda metade do século XIV. As datas entre 1384 e 1396 são apresentadas como o período em que decorreram as obras, porque correspondem à época em que D. Lourenço Vicente, arcebispo de Braga, foi senhor da Lourinhã e, segundo a tradição, teria sido ele a inaugurar o novo templo. No entanto, é provável que as obras tenham sido iniciadas antes, visto que num dos fechos da abóbada da capela-mor se encontra um escudo armoriado em que se lê a palavra “Gonçalves”, apelido de Nuno e Martim Gonçalves, donatários da Lourinhã entre 1336 e cerca de 1370.
Esta igreja foi classificada monumento nacional em 1922 e restaurada, entre 1931 e 1935, pela Direção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais.



Depois de termos ficado a conhecer a história do templo, começámos a preencher um guião de observação do edifício. É constituído por três naves, as naves laterais estão separadas da nave central por oito arcos ogivais de grande elegância, sustentados por colunas onde assentam capitéis com motivos vegetalistas - folhas e flores - todos diferentes e de grande naturalismo. Admirámos também a bela rosácea, a antiquíssima pia baptismal de oito faces e uma pia de água benta, bela peça gótica. Por fim, observámos duas arcas tumulares pouco trabalhadas: uma delas pertenceria a D. Jordão, primeiro donatário da Lourinhã, sendo caracterizada por ter um escudo com uma lua ao meio e três flores-de-lis, já a outra serviria de túmulo a um elemento da família dos Taveiras, senhores da Lourinhã no século XIII.
De seguida, fizemos o circuito exterior do monumento. Seis contrafortes reforçam as paredes da capela-mor, os quais, por sua vez, estão ligados a seis colunas que, no interior, sustentam a abóbada de cruzamento de ogivas. Também vimos, na porta a norte, conchas de vieiras esculpidas (símbolo dos peregrinos de S. Tiago de Compostela) e admirámos a beleza dos portais virados a oeste e a sul, com os seus arcos ogivais assentes sobre colunas e cujos capitéis estão decorados com motivos naturalistas e cenas do Antigo e Novo Testamento. Finalmente, observámos a torre sineira, obra do século XVI, decorada com pináculos.
Gostei imenso desta visita porque a aula sobre a arte gótica foi dada de uma forma mais prática, o que incentiva os alunos a interessarem-se mais pela matéria. Acho importante a realização de visitas de estudo porque os alunos estão mais atentos e interessados e, deste modo, aprendem melhor os conteúdos das disciplinas.

Aluno do 8.ºA, EB de Ribamar

20.7.11

As telas de Josefa de Óbidos do convento de Santo António da Lourinhã


Carolina Miguel e Eloísa Gomes

Josefa de Ayala Figueira, mais conhecida por Josefa de Óbidos, foi das poucas pintoras femininas do século XVII e a mais célebre artista nacional dessa época. Nasceu em Sevilha (Espanha) em Fevereiro de 1630 e morreu em Óbidos a 22 de Julho de 1684. Era filha de Baltazar Gomes Figueira, um pintor português, e de D. Catarina de Ayala Camacho Cabrera Romero, que era espanhola. Foi apadrinhada por um célebre pintor sevilhano, Francisco de Herrera, el Viejo. Tinha um irmão, Barnabé de Ayala, que também foi pintor.
Veio para Portugal com apenas quatro anos e desde cedo mostrou que tinha uma vocação para a pintura e também para a gravura em metal. Depois de uma breve passagem por Óbidos, em 1644, pelo menos, Josefa já estava instalada em Coimbra, no mosteiro agostinho de Sant’Ana, recebendo ensinamentos religiosos, e junto de seu pai, os primeiros rudimentos artísticos.
As primeiras obras de Josefa, executadas em Coimbra, foram as gravuras de Santa Catarina e de São José, quando tinha apenas quinze ou dezasseis anos de idade. Estas pinturas revelam já uma mão de grande destreza. No entanto, a pintora não seguiu a vida religiosa e regressou a Óbidos, para junto da sua família, que vivia na Quinta da Capeleira. Aí pintou uma gravura da Sabedoria para os novos Estatutos da Universidade de Coimbra, em 1653, com 19 anos, seguida de muitas outras.
Josefa de Óbidos pintou retratos, naturezas-mortas, retábulos, ou seja, diversos tipos de pinturas. Nos seus quadros encontra-se a técnica miniaturista, hábil de pincel e boa definidora de contrastes. Foi especialista na pintura de flores, frutas e objectos inanimados. A influência exercida pelo barroco tornaram-na uma artista com interesses diversificados, tendo-se dedicado, além da pintura, à estampa, à gravura, à modelagem do barro, ao desenho de figurinos, de tecidos, de acessórios vários e de arranjos florais.
Trabalhou como pintora para diversos conventos e igrejas, chegou até a pintar membros da família real, como a esposa de D. Pedro II e a sua filha, a princesa Isabel. A maior parte da sua vida decorreu em Óbidos, terra natal de seu pai, que beneficiava à época de uma verdadeira “corte de aldeia”, constituída por uma nobreza abastada e com um ambiente cultural propício ao desenvolvimento artístico.
Quando morreu, tinha uma vasta obra espalhada pelo país e pelo estrangeiro. Hoje, os seus quadros encontram-se em museus, conventos, igrejas e casas de particulares. Na nossa região são de destacar o Retrato do Beneficiado Faustino das Neves da Misericórdia de Óbidos (c. 1670, Museu de Óbidos), o retábulo do Altar de Santa Catarina na igreja de Santa Maria de Óbidos (1661), o Calvário da Santa Casa da Misericórdia de Peniche (1679) e as duas telas Santa Paula e Santa Eustáquia do convento de Santo António da Lourinhã (c. de 1670).





Santa Paula


Santa Eustáquia


As duas belas telas Santa Paula e Santa Eustáquia foram pintadas por Josefa de Óbidos, cerca de 1670. Estiveram na sacristia do destruído mosteiro jeronimita de Vale Benfeito (próximo da Amoreira de Óbidos) e encontram-se actualmente no convento de Santo António da Lourinhã.
Santa Paula nasceu em Itália, a 5 de Maio de 347 e morreu em Belém, em 404. Foi casada com o senador Toxócio, com quem teve cinco filhos, um deles foi Santa Eustáquia (369-419). Santa Paula ficou viúva em 379 e, com a sua filha, foi para a Terra Santa, onde se encontrava S. Jerónimo, de quem ambas eram amigas e discípulas espirituais. Com os seus conhecimentos de latim, hebreu e grego, ajudaram S. Jerónimo na tradução da Bíblia do hebraico e do grego para latim – a denominada Vulgata. Na Terra Santa a herança de família permitiu a construção de igrejas, de um hospital e de um mosteiro, do qual Santa Paula foi a primeira abadessa. Encontram-se sepultadas na Basílica da Natividade em Belém.
Os quadros de Josefa de Óbidos são do estilo barroco, estilo artístico aparecido em Itália no século XVII, tendo-se expandido principalmente pelos outros países católicos da Europa e suas colónias da América. Considerado como o estilo correspondente ao absolutismo e à contra-reforma, distingue-se pelo esplendor exuberante.
No Barroco as formas clássicas do Renascimento foram substituídas pelo movimento, pelo dramatismo e pela exuberância. As principais características da pintura do Barroco são o contraste entre a luz e a sombra, os efeitos ilusionistas, o predomínio da figura humana, representada de forma realista e a procura de efeitos decorativos e visuais com a utilização de linhas ondulantes. No Barroco foi também abandonada a composição em pirâmide do Renascimento, e adoptada a composição na diagonal, que imprime maior dinamismo às personagens.
Estas duas telas foram restauradas, pelo Instituto José de Figueiredo, para figurarem na “III Exposição sobre Josefa de Óbidos – Pintura Barroca -, na Galeria de Pintura do rei D. Luís, no Palácio da Ajuda, em 1991, que foi coordenada pelo Professor Vitor Serrão. A excelência de Josefa de Óbidos na arte do retrato, é testemunhada pela descrição que é feita no catálogo da exposição: «Obras de bom desenho, são particularmente interessantes pela “disciplina, sobriedade e beleza do estilo”, como notou Reis-Santos, nas qualidades expressionistas dos rostos e na palpitação naturalista dos brancos luminosos.»



Alunas do 8.º C, da EB de Ribamar,
Disciplina de História e Área de Projecto

(artigo publicado no jornal do Agrupamento de Escolas D. Lourenço Vicente, Junho 2011)

Bibliografia:
BATALHA, Padre Joaquim, Convento de Santo António de Lourinhã - Passado, Presente e Futuro, Lourinhã, Câmara Municipal de Lourinhã, 2003.
DINIZ, Maria Emília, TAVARES, Adérito, CALDEIRA, Arlindo M., História Oito - Parte 1, 1ª ed., Lisboa, Lisboa Editora.
SERRÃO, Vítor, História de Arte em Portugal - o Barroco, Lisboa, Ed. Presença, 2003.

23.4.11

A Cidade Romana de Eburobrittium

Catarina Cruz e Tiago Pereira, 7.º A

Vila de Óbidos


Tudo começou quando os arqueólogos tentaram encontrar uma cidade designada por Eburobrittium, referida pelo autor romano Plínio-o-Velho do séc. I, que escreveu sobre as cidades romanas na costa atlântica da Península Ibérica.
Essa cidade estaria localizada algures entre Collipo (Leiria) e Olisipo (Lisboa). Todavia, nos seus textos, o autor não referiu qual a sua localização exacta, o que levou a que diversos autores tenham procurado estabelecer a sua localização.
Então, em 1994, quando estavam a decorrer os trabalhos de construção do IP6 e do IC1 foram descobertos alguns vestígios arqueológicos da época romana que pelo interesse suscitado, conduziram desde logo a trabalhos de escavação do local. Rapidamente, os arqueólogos, sob a direcção de José Beleza Moreira, chegaram à conclusão que, realmente, estavam perante ruínas de uma cidade romana, comparável a Conímbriga. Parte dos principais edifícios encontram-se cobertos pela A8.
Pensa-se que Eburobrittium se tenha desenvolvido a partir do século I a.C., e que sobreviveu até à segunda metade do século V d.C. Foi, provavelmente, uma cidade aberta, sem capacidade de defesa, o que terá levado ao seu abandono. Para além de preocupações de ordem defensiva, o recuo das águas da Lagoa, terão motivado a transferência da povoação para o local onde hoje se encontra a vila de Óbidos. É possível que alguns dos edifícios da actual vila possam integrar materiais da antiga cidade romana.
O projecto de construção de uma cidade romana envolvia diversas pessoas. Arquitectos, topógrafos, engenheiros militares e construtores especializados trabalhavam durante vários meses para projectar, desenhar e planificar a cidade.
Os materiais utilizados na construção eram: pedra, argila (para fabricar telhas e tijolos nas fábricas), argamassa (utilizada para ligar os tijolos e as pedras e no fabrico do cimento) e madeira (utilizada nos andaimes e no travejamento dos telhados).
Iniciavam-se então a construção das duas áreas públicas mais importantes da cidade: o fórum e o mercado.


1. zona comercial, 2 - área administrativa, 3 - pátio.


O fórum era o principal centro da cidade. Nele encontravam-se as repartições públicas, como o Senado, a Basílica (tribunal) e os templos, bem como o mercado e as lojas comerciais. Foi o primeiro edifício a ser identificado de Eburobrittium.
As dimensões do Fórum são de 43,20 m de largura por 64,80 m de comprimento, o que leva a crer que terá sido edificado seguindo a regra dos dois terços, definida por Vitrúvio.
O mercado era o local onde os agricultores e comerciantes instalavam as suas tendas. Localizava-se a céu aberto, num pátio interior, rodeado por colunas. No piso superior, arrendavam-se escritórios a homens de negócios, transaccionavam produtos com outros mercados do império.
O templo do fórum está hoje sob a estrada. A basílica situar-se-ia no lado sul onde se detectou duas fiadas de sapatas para suporte de colunas. A rodear as Tabernae (zona comercial) existiria um pórtico, conforme se confirma pela presença de sapatas ao longo das mesmas.


Termas



Outra importante estrutura de Eburobrittium é o edifício termal. Apenas se encontra escavada a zona quente (lacónico, sala das banheiras, sala de descanso), um praefurnium e um corredor de serviço. O lacónico tem uma piscina circular com 3,4 metro de diâmetro, apresentando dois degraus, com 30 cm de largura.

As escavações do local foram financiadas, nas duas primeiras campanhas, através do IPPAR e posteriormente pela Câmara de Óbidos e pela Associação Nacional de Farmácias, que entretanto adquiriu também a quinta onde se encontra a estação arqueológica.
A partir de 2006, as escavações foram suspensas por falta de financiamento. Esperemos que elas possam ser retomadas, pois estamos perante uma herança arqueológica nacional de valor inestimável.


Fontes:
http://historiaaberta.com.sapo.pt/lib/loc006.htm
http://www.portugalromano.com/?p=868

8.4.11

Os painéis do Mestre da Lourinhã


Beatriz Ferreira e Daniela Sousa, 8.º C




A Santa Casa da Misericórdia da Lourinhã detém um rico espólio de pintura antiga, do qual se destacam as duas tábuas quinhentistas: São João Baptista no Deserto e São João Evangelista na Ilha de Patmos. Encontram-se, neste momento e até ao próximo dia 23 de Abril, no Museu Nacional de Arte Antiga, integrando a exposição Primitivos Portugueses (1450-1550). O Século de Nuno Gonçalves. O historiador de arte, Luís Reis-Santos, foi o primeiro a dedicar-se ao estudo destas pinturas, quando procurava obras de arte para figurarem na Grande Exposição do Mundo Português de 1940. E foi ele que atribuiu o nome de conveniência de Mestre da Lourinhã, dado se desconhecer o nome do autor. Estas obras foram encomendadas pela rainha D. Maria, segunda mulher do rei D. Manuel, para a capela-mor da igreja do mosteiro da ordem de S. Jerónimo, na ilha da Berlenga. A sua edificação, por iniciativa da soberana, foi autorizada pelo papa Leão X, em 1513. A rainha era muito devota deste santo e pretendia um mosteiro naquele local para dar apoio espiritual aos navegantes que passavam pela costa de Peniche. Devido ao isolamento e à insegurança deste sítio, os monges foram transferidos para um novo mosteiro, erguido com essa finalidade em Valbemfeito (Óbidos), por iniciativa de rainha D. Catarina de Áustria, mulher de D. João III e cuja construção foi iniciada em 1535. Quando em 1834 as ordens religiosas foram extintas, estas e outras pinturas vieram para a Santa Casa da Lourinhã a pedido do seu provedor. Segundo Vitor Serrão e Manuel Batoréo, é possível que o Mestre da Lourinhã tenha sido Álvaro Pires, pintor e iluminador da corte dos reis D. Manuel e D. João III, falecido em 1539. As obras do Mestre da Lourinhã, de inspiração flamenga, fazem a transição entre o Gótico final e o Renascimento. Com efeito, a pintura renascentista desenvolveu-se principalmente na Flandres e também em Itália, onde ocorreram duas invenções revolucionárias: a pintura a óleo (cujo inventor foi Van Eyck) e a utilização da perspectiva. A preocupação com o equilíbrio da composição, leva muitos artistas a utilizar a composição em pirâmide por ser mais simples e equilibrada. Outra característica fundamental é o naturalismo: os pintores procuravam representar os animais, as pessoas, as paisagens, as coisas na sua forma natural.



S. João Baptista no Deserto


São João Baptista é considerado o último dos profetas antes da vinda de Cristo e é também o primeiro santo do Novo Testamento. Foi João que anunciou a vinda do Messias e o reconheceu em Jesus Cristo. Quando jovem, João Baptista retirou-se para o deserto para levar uma vida de meditação e penitência. Só comia gafanhotos e mel selvagem e usava um traje feito de pele de camelo. De acordo com o Evangelho de S. Lucas, João deixou o deserto no dia da sua apresentação em Israel e começou a pregar e a baptizar nas margens do rio Jordão, tendo baptizado Jesus Cristo. S. João Baptista tornou-se no primeiro mártir do Novo Testamento, ao ser decapitado a pedido de Salomé, filha adoptiva do rei Herodes. No quadro São João Baptista no Deserto, a figura do precursor aparece em primeiro plano, destacado sobre o fundo da paisagem. As tonalidades das cores que se vão desvanecendo para azuis cada vez mais claros, dão a impressão do longínquo, onde começa o céu e acentuam a noção de profundidade ao quadro. São João Baptista está sentado com o livro da Antiga Lei aberto nas suas mãos e está a lê-lo. No colo do santo está uma ramagem, que se pode identificar como sendo uma haste de roseira, cujos picos fazem recordar os pecados cometidos pelo homem, e que com a ajuda da palavra do Senhor (representado pelo livro da Santa Lei) serão perdoados ao homem. O cordeiro deitado a seus pés simboliza «O Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo» do Evangelho de S. João, cordeiro este que aparece muitas vezes junto a São João Baptista. (Jo. 1, 29-30). Este apresenta ainda uma auréola irradiada e os traços bem marcados do rosto contribuem para uma caracterização de uma personagem que se prepara para falar aos homens e cumprir o desígnio de espalhar a Boa Nova, como afirma Manuel Batoréo.





S. João Evangelista na Ilha de Patmos


S. João Evangelista foi Apóstolo e autor do quarto Evangelho e do Livro do Apocalipse. Era filho de Zebedeu, e foi um dos primeiros doze discípulos de Jesus. Ele e o seu irmão Tiago foram chamados por Jesus (para serem seus discípulos) quando estavam num barco, a consertar redes de pesca. João esteve presente em muitos episódios da vida adulta de Cristo, como por exemplo quando se sentou ao lado dele na última Ceia e foi o único apóstolo a estar presente na Crucificação, amparando a Virgem Maria aos pés da cruz. O cenário evoca Patmos, uma ilha minúscula do mar Egeu, para onde fora exilado pelo Imperador Dominicano, sob a acusação de prática de magia. Era acusado ainda de continuar a pregar, mesmo depois de ter sido submetido a um martírio em Roma, na Porta Latina, onde foi mergulhado num caldeirão com óleo a ferver, tendo saído ileso. A cena do martírio aparece no quadro, ao fundo na entrada da povoação. S. João Evangelista enverga uma túnica vermelha que se desdobra num generoso pregueado, bem marcado nas dobras. O vermelho da veste envolve uma simbologia que para além de estar ligado ao sentido de poder, neste caso terá a ver com a cor da ciência e do conhecimento esotérico. Uma águia de grande envergadura, segurando no bico um tinteiro, está em frente ao Evangelista e é o seu símbolo tradicional, de acordo com Ezequiel. As referências à vida e actividade do santo podem ser encontradas, também, nos dois livros que se encontram a seus pés. Um desses livros está fechado numa capa com atilho, podendo evocar a Antiga Lei, agora substituída pela palavra de Cristo – o Evangelho – inscrita no outro livro, significativamente encadernado de vermelho. O velho livro da Antiga Lei está atado e fechado numa cobertura branca, cor da pureza primordial, própria dos Anjos e dos Eleitos. As folhas estão revestidas a ouro, metal precioso, símbolo da luz mais pura e do elemento em que Deus vive. No meio do rio vemos quatro embarcações cujo significado não se conseguiu determinar, mas deve-se salientar a precisão, própria de um miniaturista, como eram os iluminadores. Na margem do rio, à direita, ergue-se uma azenha, pintada com o estilo e o pormenor próprio das oficinas flamengas do século XV. As pinturas do Mestre da Lourinhã são consideradas da melhor pintura da época no país e merecem ser conhecidas por todos nós.



Alunas do 8.º C, EB de Ribamar, disciplinas de História e Área de Projecto


(artigo publicado no jornal Alvorada, em 1-04-2011)


Bibliografia:


BATORÉO, Manuel, Pintura Portuguesa do Renascimento, Mestre da Lourinhã, Lisboa, Ed. Caleidoscópio, 2004.

CIPRIANO, Rui Marques, Vamos Falar da Lourinhã, Lourinhã, Ed. Câmara Municipal da Lourinhã, [2001].

LODWICK, Marcus, Guia do Apreciador de Pintura, Lisboa, Ed. Estampa, 2003, pp.166-169.

2.4.11

A Pintura Quinhentista da Igreja Matriz da Lourinhã

Viviana Ferreira e Carolina Miguel, 8.º C

Como referimos em artigo anterior (Alvorada, 04.02.2011, p. 11) existia na capela-mor da Igreja de Santa Maria do Castelo quatro pinturas do século XVI - Anunciação, Adoração dos Pastores, Adoração dos Reis Magos e Assunção da Virgem. Estas obras, entre outras, foram transferidas para o convento de Santo António, pouco depois da extinção das ordens religiosas (1834) e da transferência da matriz da Lourinhã para a respectiva igreja. É provável que estas pinturas – óleo sobre tábuas de castanho - fossem do mesmo artista que pintou o retábulo da Igreja Matriz de Arruda dos Vinhos, pintor cujo nome se desconhece e que, por isso, recebeu o nome de conveniência de Mestre da Arruda. Segundo Joaquim Caetano «[…] o Mestre de Arruda dos Vinhos caracteriza-se pelo tratamento plástico dos panejamentos colados aos corpos ou em pregas curvas criando linhas sinuosas e sensuais que demarcam as sombras com suavidade, o mesmo gosto pela utilização de arquitectura renascentista, um alteamento das figuras de primeiro plano, já fortemente maneirista e um colorido de forte sentido decorativo, ainda que algo limitado na paleta.» Com efeito, estas obras, pintadas provavelmente entre 1530 e 1550, revelam já uma influência do Maneirismo. Esta corrente artística impôs-se na Europa, sobretudo em Itália, entre 1530 e 1580 e marcou a passagem do equilíbrio clássico e da serenidade do Renascimento para o complicado e sobrecarregado estilo Barroco. O nome deriva da imitação das «maneiras» cultivadas pelos grandes mestres italianos, como Miguel Ângelo, Rafael e Leonardo da Vinci. Começam a aparecer as figuras alongadas, retorcidas (o serpentinato), em posições afectadas e teatrais, sugerindo-se o movimento em composições por vezes desequilibradas. Passemos agora à análise das imagens, ou seja, dos episódios bíblicos e da mensagem que nos transmitem, bem como da simbologia que lhes está associada.



Anunciação


Este quadro representa Nossa Senhora e o Anjo Gabriel. Segundo o Evangelho de São Lucas, Deus enviou o anjo Gabriel anunciar a Maria que ela iria ser mãe de Jesus. Desde a Idade Média, que o tema da Anunciação tem sido muito representado na pintura. Para além das figuras centrais, podemos ainda encontrar os elementos típicos de um quadro sobre a Anunciação a Nossa Senhora como a pomba, o lírio e o livro. A pomba representa o Espírito Santo, símbolo da encarnação, em que Deus se torna homem na pessoa de Jesus; o lírio branco, símbolo de pureza, significa a virgindade de Maria e o livro remete para a profecia do Antigo Testamento de um nascimento virginal.


Adoração dos Pastores


Por um decreto do imperador romano, Octávio César Augusto, todas as pessoas que viviam no império tinham que se recensear. Como José era de Belém, pequena cidade no sul da Judeia, para aí se dirigiu com Maria, pouco antes de Jesus nascer. E foi num estábulo, onde encontraram abrigo, que Jesus nasceu. Os Evangelhos falam de pastores que, estando nas proximidades e ouvindo anjos a cantar Glória a Deus nas alturas e, na Terra, paz e boa vontade entre os homens, o foram adorar. Neste quadro podemos encontrar o menino Jesus na manjedoura, Nossa Senhora, São José e os três pastores. Os pastores encontram-se a adorar o menino. Os anjos, por cima, são um dos elementos típicos dos quadros que representam o Presépio. É de salientar ainda os jogos de luz e cor utilizados na recriação de um ambiente nocturno.



Adoração dos Reis Magos


Segundo o Evangelho de São Mateus, sábios do Oriente, designados magos, foram guiados por uma estrela até Belém, onde encontraram Jesus com sua mãe, a Virgem Maria. Os Magos adoraram o menino Jesus e ofereceram-lhe ouro, incenso e mirra. São representados com vestes e turbantes luxuosos, animais exóticos, como elefantes e relicários preciosos contendo as oferendas. A partir da Idade Média esses sábios foram denominados reis, para se distinguirem dos feiticeiros e foram-lhes atribuídos nomes: Gaspar, Melchior e Baltasar. Já nos finais desse período, começaram a ser retratados como pessoas de raças diferentes, de modo a simbolizar os três continentes conhecidos à época: Europa, Ásia e África.


Assunção da Virgem


De acordo com o Novo Testamento, Maria esteve presente em alguns momentos decisivos da vida adulta de Jesus, nomeadamente na crucificação, em que é quase sempre representada de joelhos ao pé da cruz. Depois, teria ido para Éfeso, na Turquia, acompanhada por S. João Evangelista, onde permaneceria até ao fim da vida. Três dias após a sua morte, o corpo e a alma de Maria foram elevados aos céus, no que seria denominado de Assunção da Virgem. Nas representações artísticas, a Virgem aparece sustentada por anjos. Em baixo, o seu túmulo está rodeado pelos apóstolos, que olham, admirados, para cima.


A unidade temática deste conjunto de painéis, em torno da figura de Nossa Senhora, justifica plenamente a encomenda de uma igreja matriz, cuja padroeira é Nossa Senhora da Anunciação.


Bibliografia:

CAETANO, Joaquim Oliveira Caetano, Ao Modo de Itália A Pintura Portuguesa na Idade do Humanismo, http://joaquimcaetano.wordpress.com/amor-fama-e-virtude/ao-modo-de-italia/.

LODWICK, Marcus, Guia do Apreciador de Pintura, Lisboa, Ed. Estampa, 2003. SERRÃO, Victor, História da Arte em Portugal – O Renascimento e o Maneirismo (1500-1620), Lisboa, Editorial Presença, 2002, pp. 226-229.

VERÍSSIMO, Ângela, O Maneirismo em português, http://www.isa.utl.pt/campus/3w_manei.htm

Artigo publicado no jornal Alvorada, 04.03.2011

30.3.11

A REPÚBLICA NA LOURINHÃ - A implantação do regime republicano na Lourinhã: realizações e dificuldades.


TRABALHO DOS ALUNOS DO 9.º ANO da EB de Ribamar - 2009/2010


Da pesquisa efectuada resultou:

- a publicação de páginas Web, com o seguinte endereço:




- um DVD, apresentado à comunidade nos dias 24 de Junho - feriado municipal - e 4 de Outubro, no auditório da AMAL, na Lourinhã.

2.3.11

A pintura e a escultura da Igreja de Santa Maria do Castelo da Lourinhã no Antigo Regime
(do século XVI ao início do século XIX)

A igreja matriz da Lourinhã, de invocação a Nossa Senhora da Anunciação, mais conhecida por Santa Maria do Castelo por ter sido erguida dentro das muralhas do desaparecido castelo, foi construída na segunda metade do século XIV, em estilo gótico. Foi sagrada pelo ilustre arcebispo de Braga - D. Lourenço Vicente -, natural da Lourinhã e seu senhor entre 1384-1397.
Quando se entra nesta igreja, classificada monumento nacional em 1922, não podemos deixar de nos impressionar pela beleza deste espaço. A elegância das suas colunas e dos arcos em ogiva, o naturalismo dos seus capitéis, a notável abóbada de cruzamento de ogivas que cobre a capela-mor, iluminada por cinco alongadas janelas geminadas e, na parte oposta do templo, o rendilhado da sua rosácea, fazem deste edifício uma referência na região.
Fig. 1 - Capítulos das Visitações à Igreja de N. S.ª da Anunciação, Lourinhã, 1679-1822

Idêntica sensação terá tido o representante do arcebispo ao contemplar este templo, quando o visitou entre 26 e 28 de Junho de 1683. Nos capítulos da visitação referiu que esta igreja era das “mais authorizadas” do arcebispado, não apenas pela sua antiguidade e grandeza, como também pelos ministros que a serviam (tinha então 10 sacerdotes ao seu serviço) e pela “nobreza desta villa”. Mas a igreja que o visitador observou e aquela que os habitantes da freguesia da Lourinhã semanalmente frequentavam para a missa dominical não tinha o aspecto actual. De facto, não se pode deixar de estranhar o despojamento actual deste templo – tem apenas um altar - o altar-mor -, o que é decerto invulgar num espaço de culto.
Na pesquisa efectuada sobre as Visitas Pastorais à Lourinhã no século XVII, no âmbito da dissertação de mestrado em História Regional e Local, encontrei, na Torre do Tombo, um Inventario dos Moveis da Freg.ª Matriz e Collegiada de N. Snr.ª da Anunciação ou Annunciada da vila da Lourinhãa, datado de 15 de Novembro de 1806, que contém um rol dos altares, obras de arte, paramentaria e objectos litúrgicos. Pela descrição que faz do interior da igreja, não será difícil imaginar a magnificência dos seus altares, provavelmente em talha dourada como era comum na maioria dos nossas igrejas, cobertos com os respectivos frontais, ou a centralidade do seu púlpito, antigo e de grades, decorado com panos de seda ou damasco, para onde os fiéis dirigiam a sua atenção na homilia dominical e nas grandes pregações feitas durante as festas maiores do calendário litúrgico. Ou ainda, a partir de outras fontes, visualizar o esplendor da liturgia das horas canónicas, que quotidianamente eram cantadas pelos oito beneficiados da Colegiada e cujo coro funcionava na capela-mor, separada, nessa época, do corpo da igreja por um gradeamento.
As várias imagens, que estavam nas paredes, nos altares ou na sacristia, dão-nos informações muito interessantes sobre o universo devocional do povo da Lourinhã no Antigo Regime, bem como das devoções incentivadas pela Igreja após o Concílio de Trento (1545-1563).
No altar-mor estava colocada uma “perfeita” imagem de N. S.ª da Anunciação no trono e um Crucifixo sobre a banqueta do altar; nas paredes da capela-mor, do lado do Evangelho, um painel da Anunciação e outro da Adoração dos Magos e do lado da Epístola, um painel do Nascimento de Jesus Cristo e outro da Assunção de Nossa Senhora, todos muito antigos.
No corpo da igreja, do lado do Evangelho, havia dois altares colaterais: no primeiro estavam as imagens de S. Miguel, Santo António e Santa Luzia, todas de madeira; o segundo era uma capela interior onde se encontrava o Sacrário do Santíssimo Sacramento. Do lado da Epístola, no primeiro altar colateral estavam imagens antigas de S. João Baptista e de Santo Antão, todas de madeira e uma de S. Marcos, de pedra retocada; no segundo, uma “perfeita” imagem de Cristo Crucificado e duas de Nossa Senhora, do Rosário e da Saúde, todas de madeira. Sobre o átrio do Cruzeiro havia uma “grande e perfeita” imagem de Cristo Crucificado.
Na sacristia existia uma imagem muito antiga da Senhora da Anunciada, de pedra, outra da Senhora do Patrocínio e ainda outra do Senhor Ressuscitado; três painéis muito antigos, um de S. Francisco de Assis, outro de Santa Luzia, outro de Santa Margarida, um Cristo Crucificado e duas imagens do Menino Jesus.
Apesar do referido inventário datar apenas de 1806 (finais do Antigo Regime), algumas das imagens remontam a um período mais antigo. Com efeito, os painéis da capela-mor (actualmente na igreja do convento de Santo António) foram identificados pelos historiadores de arte como sendo pinturas quinhentistas e as fontes consultadas permitem-nos datar outras obras de, pelo menos, do século XVII. Com efeito, o culto a Santa Luzia foi introduzido por Simão Fernandes que instituiu uma confraria com esse objectivo, quando era beneficiado da Colegiada, entre os anos de 1623 ou 1624, datas prováveis da sua chegada à Lourinhã e 1639, ano em que foi preso pela Inquisição acusado de ser cristão-novo. Será esta a bela imagem seiscentista, adquirida por este beneficiado e que Rui Cipriano diz ter sido transferida pela população do Seixal para a sua igreja? O processo de Simão Fernandes também refere que este sacerdote celebrava diariamente, ora no altar de S. João, ora no altar de Santo António e que tinha alcançado, de Roma, um Breve para ser privilegiado o altar de Nossa Senhora do Rosário (existia também na igreja paroquial uma confraria com esta invocação desde os finais do século XVI).

Fig. 2 – Ruínas da Igreja Matriz da Lourinhã, gravura dos finais do século XIX, [SIPA FOTO.0822935 © IHRU].

O abandono desta igreja, pouco depois da extinção das ordens religiosas em 1834, e a transferência da matriz para a igreja do convento de Santo António, com as respectivas imagens, fez com que se perdesse o rasto a algumas delas. Quando a Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais procedeu ao restauro da velha igreja matriz (1931-1935), a concepção dominante era a de que se deveria devolver o templo à sua “pureza” primitiva, neste caso à sua raiz medieval. Daí que tenham sido retirados muitos dos acrescentos posteriores, nomeadamente a sacristia, que já aparece referida na visitação de 1630.
Em 1991, 3 de Março, com a presença do Cardeal Patriarca de Lisboa, D. António Ribeiro, a igreja de Santa Maria do Castelo recuperou o estatuto de Matriz da Lourinhã, na sequência de diligências feitas pelo pároco de então - P.e Joaquim Batalha. Que este e outros trabalhos contribuam para recuperar a memória da dignidade deste espaço!

(artigo publicado no jornal Alvorada, em 4.02.2011)


Maria dos Anjos dos Santos Fernandes Luís,
professora de História da EB de Ribamar

FONTES:
— Arquivo Paroquial da Lourinhã/Convento de Santo António, Capítulos das Visitações à Igreja de Nossa Senhora da Anunciação, 1679-1822.
— IAN/TT, Arquivo Histórico do Ministério das Finanças, Mesa da Consciência e Ordens, Ordem de Cristo, Autos de Posse da Comenda de Nossa Senhora da Anunciação da Lourinhã, 1677-1829, cx. 62, Cap. 8, fl. 12.
— IAN/TT, Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Lisboa, Simão Fernandes, proc. n.º 6621, 09.05.1639-19.08.1649, fls. 40, 136 e 137.