23.4.11

A Cidade Romana de Eburobrittium

Catarina Cruz e Tiago Pereira, 7.º A

Vila de Óbidos


Tudo começou quando os arqueólogos tentaram encontrar uma cidade designada por Eburobrittium, referida pelo autor romano Plínio-o-Velho do séc. I, que escreveu sobre as cidades romanas na costa atlântica da Península Ibérica.
Essa cidade estaria localizada algures entre Collipo (Leiria) e Olisipo (Lisboa). Todavia, nos seus textos, o autor não referiu qual a sua localização exacta, o que levou a que diversos autores tenham procurado estabelecer a sua localização.
Então, em 1994, quando estavam a decorrer os trabalhos de construção do IP6 e do IC1 foram descobertos alguns vestígios arqueológicos da época romana que pelo interesse suscitado, conduziram desde logo a trabalhos de escavação do local. Rapidamente, os arqueólogos, sob a direcção de José Beleza Moreira, chegaram à conclusão que, realmente, estavam perante ruínas de uma cidade romana, comparável a Conímbriga. Parte dos principais edifícios encontram-se cobertos pela A8.
Pensa-se que Eburobrittium se tenha desenvolvido a partir do século I a.C., e que sobreviveu até à segunda metade do século V d.C. Foi, provavelmente, uma cidade aberta, sem capacidade de defesa, o que terá levado ao seu abandono. Para além de preocupações de ordem defensiva, o recuo das águas da Lagoa, terão motivado a transferência da povoação para o local onde hoje se encontra a vila de Óbidos. É possível que alguns dos edifícios da actual vila possam integrar materiais da antiga cidade romana.
O projecto de construção de uma cidade romana envolvia diversas pessoas. Arquitectos, topógrafos, engenheiros militares e construtores especializados trabalhavam durante vários meses para projectar, desenhar e planificar a cidade.
Os materiais utilizados na construção eram: pedra, argila (para fabricar telhas e tijolos nas fábricas), argamassa (utilizada para ligar os tijolos e as pedras e no fabrico do cimento) e madeira (utilizada nos andaimes e no travejamento dos telhados).
Iniciavam-se então a construção das duas áreas públicas mais importantes da cidade: o fórum e o mercado.


1. zona comercial, 2 - área administrativa, 3 - pátio.


O fórum era o principal centro da cidade. Nele encontravam-se as repartições públicas, como o Senado, a Basílica (tribunal) e os templos, bem como o mercado e as lojas comerciais. Foi o primeiro edifício a ser identificado de Eburobrittium.
As dimensões do Fórum são de 43,20 m de largura por 64,80 m de comprimento, o que leva a crer que terá sido edificado seguindo a regra dos dois terços, definida por Vitrúvio.
O mercado era o local onde os agricultores e comerciantes instalavam as suas tendas. Localizava-se a céu aberto, num pátio interior, rodeado por colunas. No piso superior, arrendavam-se escritórios a homens de negócios, transaccionavam produtos com outros mercados do império.
O templo do fórum está hoje sob a estrada. A basílica situar-se-ia no lado sul onde se detectou duas fiadas de sapatas para suporte de colunas. A rodear as Tabernae (zona comercial) existiria um pórtico, conforme se confirma pela presença de sapatas ao longo das mesmas.


Termas



Outra importante estrutura de Eburobrittium é o edifício termal. Apenas se encontra escavada a zona quente (lacónico, sala das banheiras, sala de descanso), um praefurnium e um corredor de serviço. O lacónico tem uma piscina circular com 3,4 metro de diâmetro, apresentando dois degraus, com 30 cm de largura.

As escavações do local foram financiadas, nas duas primeiras campanhas, através do IPPAR e posteriormente pela Câmara de Óbidos e pela Associação Nacional de Farmácias, que entretanto adquiriu também a quinta onde se encontra a estação arqueológica.
A partir de 2006, as escavações foram suspensas por falta de financiamento. Esperemos que elas possam ser retomadas, pois estamos perante uma herança arqueológica nacional de valor inestimável.


Fontes:
http://historiaaberta.com.sapo.pt/lib/loc006.htm
http://www.portugalromano.com/?p=868

8.4.11

Os painéis do Mestre da Lourinhã


Beatriz Ferreira e Daniela Sousa, 8.º C




A Santa Casa da Misericórdia da Lourinhã detém um rico espólio de pintura antiga, do qual se destacam as duas tábuas quinhentistas: São João Baptista no Deserto e São João Evangelista na Ilha de Patmos. Encontram-se, neste momento e até ao próximo dia 23 de Abril, no Museu Nacional de Arte Antiga, integrando a exposição Primitivos Portugueses (1450-1550). O Século de Nuno Gonçalves. O historiador de arte, Luís Reis-Santos, foi o primeiro a dedicar-se ao estudo destas pinturas, quando procurava obras de arte para figurarem na Grande Exposição do Mundo Português de 1940. E foi ele que atribuiu o nome de conveniência de Mestre da Lourinhã, dado se desconhecer o nome do autor. Estas obras foram encomendadas pela rainha D. Maria, segunda mulher do rei D. Manuel, para a capela-mor da igreja do mosteiro da ordem de S. Jerónimo, na ilha da Berlenga. A sua edificação, por iniciativa da soberana, foi autorizada pelo papa Leão X, em 1513. A rainha era muito devota deste santo e pretendia um mosteiro naquele local para dar apoio espiritual aos navegantes que passavam pela costa de Peniche. Devido ao isolamento e à insegurança deste sítio, os monges foram transferidos para um novo mosteiro, erguido com essa finalidade em Valbemfeito (Óbidos), por iniciativa de rainha D. Catarina de Áustria, mulher de D. João III e cuja construção foi iniciada em 1535. Quando em 1834 as ordens religiosas foram extintas, estas e outras pinturas vieram para a Santa Casa da Lourinhã a pedido do seu provedor. Segundo Vitor Serrão e Manuel Batoréo, é possível que o Mestre da Lourinhã tenha sido Álvaro Pires, pintor e iluminador da corte dos reis D. Manuel e D. João III, falecido em 1539. As obras do Mestre da Lourinhã, de inspiração flamenga, fazem a transição entre o Gótico final e o Renascimento. Com efeito, a pintura renascentista desenvolveu-se principalmente na Flandres e também em Itália, onde ocorreram duas invenções revolucionárias: a pintura a óleo (cujo inventor foi Van Eyck) e a utilização da perspectiva. A preocupação com o equilíbrio da composição, leva muitos artistas a utilizar a composição em pirâmide por ser mais simples e equilibrada. Outra característica fundamental é o naturalismo: os pintores procuravam representar os animais, as pessoas, as paisagens, as coisas na sua forma natural.



S. João Baptista no Deserto


São João Baptista é considerado o último dos profetas antes da vinda de Cristo e é também o primeiro santo do Novo Testamento. Foi João que anunciou a vinda do Messias e o reconheceu em Jesus Cristo. Quando jovem, João Baptista retirou-se para o deserto para levar uma vida de meditação e penitência. Só comia gafanhotos e mel selvagem e usava um traje feito de pele de camelo. De acordo com o Evangelho de S. Lucas, João deixou o deserto no dia da sua apresentação em Israel e começou a pregar e a baptizar nas margens do rio Jordão, tendo baptizado Jesus Cristo. S. João Baptista tornou-se no primeiro mártir do Novo Testamento, ao ser decapitado a pedido de Salomé, filha adoptiva do rei Herodes. No quadro São João Baptista no Deserto, a figura do precursor aparece em primeiro plano, destacado sobre o fundo da paisagem. As tonalidades das cores que se vão desvanecendo para azuis cada vez mais claros, dão a impressão do longínquo, onde começa o céu e acentuam a noção de profundidade ao quadro. São João Baptista está sentado com o livro da Antiga Lei aberto nas suas mãos e está a lê-lo. No colo do santo está uma ramagem, que se pode identificar como sendo uma haste de roseira, cujos picos fazem recordar os pecados cometidos pelo homem, e que com a ajuda da palavra do Senhor (representado pelo livro da Santa Lei) serão perdoados ao homem. O cordeiro deitado a seus pés simboliza «O Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo» do Evangelho de S. João, cordeiro este que aparece muitas vezes junto a São João Baptista. (Jo. 1, 29-30). Este apresenta ainda uma auréola irradiada e os traços bem marcados do rosto contribuem para uma caracterização de uma personagem que se prepara para falar aos homens e cumprir o desígnio de espalhar a Boa Nova, como afirma Manuel Batoréo.





S. João Evangelista na Ilha de Patmos


S. João Evangelista foi Apóstolo e autor do quarto Evangelho e do Livro do Apocalipse. Era filho de Zebedeu, e foi um dos primeiros doze discípulos de Jesus. Ele e o seu irmão Tiago foram chamados por Jesus (para serem seus discípulos) quando estavam num barco, a consertar redes de pesca. João esteve presente em muitos episódios da vida adulta de Cristo, como por exemplo quando se sentou ao lado dele na última Ceia e foi o único apóstolo a estar presente na Crucificação, amparando a Virgem Maria aos pés da cruz. O cenário evoca Patmos, uma ilha minúscula do mar Egeu, para onde fora exilado pelo Imperador Dominicano, sob a acusação de prática de magia. Era acusado ainda de continuar a pregar, mesmo depois de ter sido submetido a um martírio em Roma, na Porta Latina, onde foi mergulhado num caldeirão com óleo a ferver, tendo saído ileso. A cena do martírio aparece no quadro, ao fundo na entrada da povoação. S. João Evangelista enverga uma túnica vermelha que se desdobra num generoso pregueado, bem marcado nas dobras. O vermelho da veste envolve uma simbologia que para além de estar ligado ao sentido de poder, neste caso terá a ver com a cor da ciência e do conhecimento esotérico. Uma águia de grande envergadura, segurando no bico um tinteiro, está em frente ao Evangelista e é o seu símbolo tradicional, de acordo com Ezequiel. As referências à vida e actividade do santo podem ser encontradas, também, nos dois livros que se encontram a seus pés. Um desses livros está fechado numa capa com atilho, podendo evocar a Antiga Lei, agora substituída pela palavra de Cristo – o Evangelho – inscrita no outro livro, significativamente encadernado de vermelho. O velho livro da Antiga Lei está atado e fechado numa cobertura branca, cor da pureza primordial, própria dos Anjos e dos Eleitos. As folhas estão revestidas a ouro, metal precioso, símbolo da luz mais pura e do elemento em que Deus vive. No meio do rio vemos quatro embarcações cujo significado não se conseguiu determinar, mas deve-se salientar a precisão, própria de um miniaturista, como eram os iluminadores. Na margem do rio, à direita, ergue-se uma azenha, pintada com o estilo e o pormenor próprio das oficinas flamengas do século XV. As pinturas do Mestre da Lourinhã são consideradas da melhor pintura da época no país e merecem ser conhecidas por todos nós.



Alunas do 8.º C, EB de Ribamar, disciplinas de História e Área de Projecto


(artigo publicado no jornal Alvorada, em 1-04-2011)


Bibliografia:


BATORÉO, Manuel, Pintura Portuguesa do Renascimento, Mestre da Lourinhã, Lisboa, Ed. Caleidoscópio, 2004.

CIPRIANO, Rui Marques, Vamos Falar da Lourinhã, Lourinhã, Ed. Câmara Municipal da Lourinhã, [2001].

LODWICK, Marcus, Guia do Apreciador de Pintura, Lisboa, Ed. Estampa, 2003, pp.166-169.

2.4.11

A Pintura Quinhentista da Igreja Matriz da Lourinhã

Viviana Ferreira e Carolina Miguel, 8.º C

Como referimos em artigo anterior (Alvorada, 04.02.2011, p. 11) existia na capela-mor da Igreja de Santa Maria do Castelo quatro pinturas do século XVI - Anunciação, Adoração dos Pastores, Adoração dos Reis Magos e Assunção da Virgem. Estas obras, entre outras, foram transferidas para o convento de Santo António, pouco depois da extinção das ordens religiosas (1834) e da transferência da matriz da Lourinhã para a respectiva igreja. É provável que estas pinturas – óleo sobre tábuas de castanho - fossem do mesmo artista que pintou o retábulo da Igreja Matriz de Arruda dos Vinhos, pintor cujo nome se desconhece e que, por isso, recebeu o nome de conveniência de Mestre da Arruda. Segundo Joaquim Caetano «[…] o Mestre de Arruda dos Vinhos caracteriza-se pelo tratamento plástico dos panejamentos colados aos corpos ou em pregas curvas criando linhas sinuosas e sensuais que demarcam as sombras com suavidade, o mesmo gosto pela utilização de arquitectura renascentista, um alteamento das figuras de primeiro plano, já fortemente maneirista e um colorido de forte sentido decorativo, ainda que algo limitado na paleta.» Com efeito, estas obras, pintadas provavelmente entre 1530 e 1550, revelam já uma influência do Maneirismo. Esta corrente artística impôs-se na Europa, sobretudo em Itália, entre 1530 e 1580 e marcou a passagem do equilíbrio clássico e da serenidade do Renascimento para o complicado e sobrecarregado estilo Barroco. O nome deriva da imitação das «maneiras» cultivadas pelos grandes mestres italianos, como Miguel Ângelo, Rafael e Leonardo da Vinci. Começam a aparecer as figuras alongadas, retorcidas (o serpentinato), em posições afectadas e teatrais, sugerindo-se o movimento em composições por vezes desequilibradas. Passemos agora à análise das imagens, ou seja, dos episódios bíblicos e da mensagem que nos transmitem, bem como da simbologia que lhes está associada.



Anunciação


Este quadro representa Nossa Senhora e o Anjo Gabriel. Segundo o Evangelho de São Lucas, Deus enviou o anjo Gabriel anunciar a Maria que ela iria ser mãe de Jesus. Desde a Idade Média, que o tema da Anunciação tem sido muito representado na pintura. Para além das figuras centrais, podemos ainda encontrar os elementos típicos de um quadro sobre a Anunciação a Nossa Senhora como a pomba, o lírio e o livro. A pomba representa o Espírito Santo, símbolo da encarnação, em que Deus se torna homem na pessoa de Jesus; o lírio branco, símbolo de pureza, significa a virgindade de Maria e o livro remete para a profecia do Antigo Testamento de um nascimento virginal.


Adoração dos Pastores


Por um decreto do imperador romano, Octávio César Augusto, todas as pessoas que viviam no império tinham que se recensear. Como José era de Belém, pequena cidade no sul da Judeia, para aí se dirigiu com Maria, pouco antes de Jesus nascer. E foi num estábulo, onde encontraram abrigo, que Jesus nasceu. Os Evangelhos falam de pastores que, estando nas proximidades e ouvindo anjos a cantar Glória a Deus nas alturas e, na Terra, paz e boa vontade entre os homens, o foram adorar. Neste quadro podemos encontrar o menino Jesus na manjedoura, Nossa Senhora, São José e os três pastores. Os pastores encontram-se a adorar o menino. Os anjos, por cima, são um dos elementos típicos dos quadros que representam o Presépio. É de salientar ainda os jogos de luz e cor utilizados na recriação de um ambiente nocturno.



Adoração dos Reis Magos


Segundo o Evangelho de São Mateus, sábios do Oriente, designados magos, foram guiados por uma estrela até Belém, onde encontraram Jesus com sua mãe, a Virgem Maria. Os Magos adoraram o menino Jesus e ofereceram-lhe ouro, incenso e mirra. São representados com vestes e turbantes luxuosos, animais exóticos, como elefantes e relicários preciosos contendo as oferendas. A partir da Idade Média esses sábios foram denominados reis, para se distinguirem dos feiticeiros e foram-lhes atribuídos nomes: Gaspar, Melchior e Baltasar. Já nos finais desse período, começaram a ser retratados como pessoas de raças diferentes, de modo a simbolizar os três continentes conhecidos à época: Europa, Ásia e África.


Assunção da Virgem


De acordo com o Novo Testamento, Maria esteve presente em alguns momentos decisivos da vida adulta de Jesus, nomeadamente na crucificação, em que é quase sempre representada de joelhos ao pé da cruz. Depois, teria ido para Éfeso, na Turquia, acompanhada por S. João Evangelista, onde permaneceria até ao fim da vida. Três dias após a sua morte, o corpo e a alma de Maria foram elevados aos céus, no que seria denominado de Assunção da Virgem. Nas representações artísticas, a Virgem aparece sustentada por anjos. Em baixo, o seu túmulo está rodeado pelos apóstolos, que olham, admirados, para cima.


A unidade temática deste conjunto de painéis, em torno da figura de Nossa Senhora, justifica plenamente a encomenda de uma igreja matriz, cuja padroeira é Nossa Senhora da Anunciação.


Bibliografia:

CAETANO, Joaquim Oliveira Caetano, Ao Modo de Itália A Pintura Portuguesa na Idade do Humanismo, http://joaquimcaetano.wordpress.com/amor-fama-e-virtude/ao-modo-de-italia/.

LODWICK, Marcus, Guia do Apreciador de Pintura, Lisboa, Ed. Estampa, 2003. SERRÃO, Victor, História da Arte em Portugal – O Renascimento e o Maneirismo (1500-1620), Lisboa, Editorial Presença, 2002, pp. 226-229.

VERÍSSIMO, Ângela, O Maneirismo em português, http://www.isa.utl.pt/campus/3w_manei.htm

Artigo publicado no jornal Alvorada, 04.03.2011